as empresas não sabem do que precisam. Perdidas no seu desejo de serem únicas, de se diferenciar dos concorrentes, esquecem que todas operam segundo uma dinâmica muito básica: a necessidade de lucro. Por tal distração elas gastam tempo e dinheiro, perdidas no cardápio cada vez mais variado de novas promessas e velhas promessas com nome novo, promessas de sistemas, filosofias, metodologias e ferramentas que irão levá-las a alcançar a tão desgastada excelência operacional.
o lucro, em termos simples e desconsiderando as complexidades da contabilidade, é o dinheiro que sobra das vendas depois que a empresa paga os custos de gerar e vender seu produto. É para a empresa como o oxigênio é para o ser humano: sem ele, não é possível continuar existindo e crescendo. Mas ainda assim, quando o assunto é lucrar mais ou ao menos lucrar, as empresas esquecem deste fato e se apegam a qual é a novidade do momento em termos de gestão do negócio.
para ter lucro em livre mercado – o que é um termo generoso considerando o quanto temos de exceções às regras e outras implícitas que definem um livre mercado -, e em especial se seu produto não é único, ou já maduro, existe uma relação fundamental que foi o núcleo da percepção da Toyota, se tornando o farol que orienta o seu processo de kaizen:
lucro = preço – custo
a simples relação acima nos lembra de algo fundamental quando temos concorrência: o cliente tem poder de escolha, e estamos lidando não somente com nossas decisões de negócio, mas também com as dos nossos concorrentes.
isso significa entender que não controlamos tanto os preços quanto imaginamos, ao menos se queremos participar e crescer o negócio de forma justa e saudável. Se há mais oferta do que demanda por um produto, seu preço cai na tentativa de fazer com que este seja comprado. Quando há mais demanda do que oferta, o preço sobe, na tentativa de extrair mais margem em cada venda. Neste cenário, aquilo que está mais sob nosso controle e atuação direta são os custos. Diante disso, nosso lucro será o que sobrar do preço que o mercado define após subtrairmos o nosso custo.
entretanto, muitas empresas ainda operam segundo um outro guia, que tende a levar o negócio para águas profundas e cruéis:
preço = custo + lucro
tais empresas, quando não operam considerando que o custo é dado, imutável e independente delas, – usando por exemplo, a questão legítima dos impostos, como muleta – operam fazendo cortes insustentáveis e pouco inteligentes, como redução de quadro de funcionários ou a diminuição da qualidade de seus produtos, perdendo músculo ao invés de gordura para reduzir seu peso.
como antídoto a isso, a equação lucro = preço – custo é o resumo da descoberta da Toyota de que o custo não é feito somente daquilo que é necessário, mas sim, também do desnecessário. E o desnecessário – que se tornou famoso pelo nome desperdício – surge da forma como organizamos o nosso trabalho em torno dos recursos que temos, o que a empresa chamou de técnica de manufatura [1]. Nesta ideia da redução de custos, para os defensores de que nem só disso vive uma empresa, mas sim, de encantar seus clientes, tal necessidade já está embutida na ideia de que não se reduz qualidade – sendo esta o atendimento ao requisito e necessidade do cliente – para reduzir custos. Aqui vemos mais um diferencial em interpretar o que a empresa fez como queria Taiichi Ohno: um sistema de gestão, e não um método de produção [2].
claramente a interação entre preço, custo e lucro é mais complexa do que o que somos capazes de considerar aqui, assim como a relação de oferta e demanda, fato que a própria área da Economia ignora em seus modelos. Há a subjetividade do cliente, que nem sempre busca o produto com melhor custo benefício técnico, mas sim, também o custo benefício social e psicológico de ter um produto que faça ele se sentir pertencente a uma qualidade superior de ser humanos, a influência dos interesses do Estado e da iniciativa privada, e outros. E isso só torna ainda mais importante olharmos diariamente para o nosso trabalho e questionar o que é necessário e com base em que premissas é necessário.
mas o que não falta hoje em dia são eventos para promover soluções e seus estudos de caso de curto prazo. Cada um em seu nicho, formam clubes para falar de como a “grama do vizinho é mais verde” porque ele usa este ou outro “adubo”, como se a vitalidade da grama dependesse apenas do adubo. E o adubo nos faz esquecer, neste mar de opções de fertilidade, de como funciona o lucro. O resultado é termos as gestões pedindo pela implementação de 5S, TPM, lean, agilidade, kanban, lean seis sigma, e outros, porém preocupadas se estão usando o pacote do momento ao invés de se o pacote está ajudando no lucro. Não se assuste se encontrar empresários ou seus funcionários dizendo “precisamos fazer um Mapeamento do Fluxo de Valor”, mas ficarem mudos se você perguntar o motivo.
por isso, não se esqueça que todos os problemas que você tem, – e seus concorrentes, em algum grau, também – como reclamações de clientes, problemas de qualidade, retrabalho, excesso de burocracias, demora na execução de tarefas, no final, se resumem a aumento de custo. E assim, quando você ver os pomposos eventos promovendo modos de pensar e suas práticas, se for inteligente o suficiente, e mais do que isso, sábio o suficiente, vai se lembrar de que seu objetivo lá não é sair querendo implementar a, b ou c, mas sim, entender como cada um deles pode fazer você sobreviver melhor nesta dinâmica de oferta e demanda.
por Bruno Vasquez
notas e referencias
[1] Japan Management Association (eds.) (1986) Kanban just-in-time at Toyota: management begins at the workplace. Revised Edition. Portland: Productivity Press, p. 8
[2] Shinohara, I. (1988) NPS – New Production System: JIT crossing industry borders. Cambridge: Productivity Press, p. 153-156
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